O MPLA, partido no poder em Angola há 46 anos, ordenou hoje à justiça angolana para chamar à responsabilidade os autores do “acto bárbaro”, que colocou em causa a integridade física e dignidade de profissionais da informação dos seus órgãos privados (mas pagos com dinheiros públicos) de comunicação social.
Aposição foi expressa num comunicado final do Secretariado do Bureau Político do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA) saído de uma reunião realizada sob orientação do secretário-geral, Paulo Pombolo, que serviu para apreciar o memorando dos trabalhos da Divisão Político-Administrativa das províncias do Cuando Cubango, Malanje, Moxico, Uíge e Lunda-Norte.
No comunicado, o Secretariado do Bureau Político do MPLA (de acordos com ordens superiores do seu Presidente, João Lourenço) condena “veementemente a agressão física e verbal perpetrada no dia 11 de Setembro pela UNITA [União Nacional para a Independência Total de Angola”, maior partido da oposição que o MPLA ainda permite] aos jornalistas das TPA – Televisão Pública do MPLA e da TV Zimbo, igualmente do MPLA.
O partido no poder há 46 anos em Angola apela (na linguagem do MPLA significa ordena) aos órgãos da administração da justiça (todos sucursais do MPLA) e às entidades que regulam o sector da comunicação social (igualmente dominados pelo MPLA), no sentido de “chamarem à responsabilidade os autores do acto bárbaro, que colocou em causa a integridade física e a dignidade dos profissionais da informação, que estavam devidamente identificados e em pleno exercício das suas nobres funções”.
“O Secretariado do Bureau Político do MPLA considera grave e preocupante o facto de não ser a primeira vez que a UNITA adopta uma atitude violenta contra jornalistas, o que constitui um reiterado atentado contra o exercício da liberdade de expressão e de imprensa protegidas pela Constituição e demais legislação”, lê-se na nota.
Outra nota de “repúdio” no comunicado foi para “os actos de provocação e os desmandos protagonizados pela UNITA, durante o último fim-de-semana em algumas províncias do país, enquadrando tais comportamentos antidemocráticos no âmbito da sua sistemática estratégia de fomentar a instabilidade política e social, bem como a subversão da ordem constitucional”.
Faltou apenas condenar a UNITA pelos massacres de 27 de Maio de 1977…
Aos militantes, simpatizantes e amigos do partido, o secretariado exorta “a continuarem a cerrar fileiras em torno da liderança do camarada Presidente João Lourenço, mantendo-se serenos e vigilantes, abstendo-se de reagir aos actos de intolerância política da UNITA, em nome dos superiores interesses da nação”.
“O Secretariado do Bureau Político aproveita a oportunidade para apelar aos cidadãos e às forças vivas da sociedade a fim de continuarem a promover a cultura da paz e da democracia, bem como a preservarem a unidade e a reconciliação nacional”, exorta o MPLA.
Os profissionais dos dois órgãos públicos angolanos foram intimidados e ameaçados por manifestantes durante a cobertura da marcha que juntou, no sábado, em Luanda, milhares de apoiantes e simpatizantes da UNITA e outros partidos da oposição angolana, bem como membros da sociedade civil, exigindo eleições justas, livres e transparentes.
Os membros do Secretariado do Bureau Político saudaram a iniciativa do Presidente da República, congratulando-se com o processo de auscultação dos cidadãos e da sociedade civil sobre a divisão política e administrativa, que visa a promoção do desenvolvimento harmonioso de Angola, ajustar e adequar a divisão político-administrativa do país para uma gestão mais justa, eficiente e equilibrada do território nacional, assim como a satisfação das necessidades individuais e colectivas.
A UNITA diz que não se retrata e que não houve qualquer agressão, o que é confirmado pelo secretário-geral do Sindicato dos Jornalistas Angolanos (SJA). Para documentar a agressão, pela pata do seu deputado João Pinto o MPLA publicou na TPA e na TV Zimbo a foto do jornalista guineense Adão Ramalho, espancado no passado dia 12 de Março, em Bissau.
Para as duas televisões do Estado, a notícia da marcha foi sobre uma suposta agressão a jornalistas seus e que foram impedidos que cobrir o acto.
A TV Zimbo repudiou o acto e pediu que a UNITA se retrate, a TPA também em comunicado fez o mesmo e disse que, caso contrário, não mais vai aparecer em actividades realizadas pelo partido.
A UNITA diz que as duas televisões mentiram e garante que durante o acto nenhum jornalista foi agredido fisicamente.
“A partir do momento que a TV Zimbo passa para tutela do Estado transformou-se, sobre este facto está a ser moralista sem moral, se houve um jornalista agredido não apresentaram por quê o referido jornalista a falar? Se houve agressão física, então a polícia no local não ia prender os agressores? Mentir também não é assim”, reagiu a deputada da UNITA, Mihaela Webba, que garante que o partido não vai se vai retratar de algo fabricado pelas referidas televisões.
Quanto à decisão da TPA de não cobrir eventos da UNITA a parlamentar considera que “não fazem falta porque só fazem um péssimo trabalho, e se se não aparecerem só nos fazem um favor”.
Por seu lado, o secretário-geral do SJA, Teixeira Cândido, condenou o acto em si independentemente de ter havido agressão física ou não.
“Os responsáveis são os gestores dos órgãos e não os jornalistas, quem deve explicar os péssimos trabalhos são os gestores dos órgãos”, afirmou Teixeira Cândido, que garante que “não houve nenhum jornalista agredido fisicamente, e a foto que circula nas redes sociais não é de nenhum jornalista angolano, aqui houve manipulação de factos”.
No dia 9 de Agosto de 2017, a UNITA recusou conceder à televisão do MPLA uma entrevista com Isaías Samakuva, principal candidato do partido às eleições de 23 de Agosto desse ano, e anunciou que iria prescindir da cobertura da TPA no resto das suas acções de campanha. Fez muito bem. Ser maltratado e aceitar umas migalhas seria beneficiar um infractor que, desde sempre, é um órgão de propaganda do regime.
Em declarações à agência Lusa o então mandatário de campanha da UNITA, Estêvão José Pedro Katchiungo, considerou que a TPA não estava a dar um tratamento igual às forças políticas envolvidas em campanha eleitoral, algo que, acusou, “viola os princípios éticos, o código de conduta dos jornalistas e a lei eleitoral”.
A UNITA, tal como os restantes partidos concorrentes, sabia que a TPA é um mero instrumento de propaganda do MPLA. Contudo, falar de princípios éticos e de deontologia jornalística num bordel que só serve para branquear os crimes cometidos pelo regime é errado. Aquela sarjeta do regime, tal como a RNA e o Jornal de Angola, são tudo menos órgãos de comunicação social. Daí não ser correcto misturar jornalistas com prostitutos.
“Isto está a tomar contornos de crime (…) É escandalosamente desproporcional o tempo e o destaque dado pelos órgãos de comunicação social estatais” ao candidato do MPLA, João Lourenço, em detrimento dos restantes cabeças de lista, considerou o responsável da UNITA. Isso foi, recorde-se, em 2017.
Seria um escândalo se a TPA fosse um órgão do Estado e, portanto de Angola. Mas como é um órgão do MPLA, até se compreende que tudo faça para agradar ao patrão. Numa democracia e num Estado de Direito tal não seria permitido, mas como Angola não é nada disso…
Numa carta enviada no dia 9 de Agosto de 2017 ao Conselho de Administração da TPA (Comité Central do MPLA), o mandatário da UNITA formalizou a recusa da UNITA em conceder à televisão uma entrevista com o seu presidente, Isaías Samakuva.
Estêvão José Pedro Katchiungo considerou na missiva “não ser de interesse público o expediente alternativo das entrevistas individuais (…) pelo que declinamos o convite que nos foi formulado para uma entrevista ao candidato da UNITA para o próximo dia 14 de Agosto”.
O convite para uma entrevista tinha partido da Televisão Pública do MPLA (TPA) e surgia integrado num conjunto de conversas individuais com os cabeças-de-lista dos partidos que disputavam as eleições gerais, expediente bacoco usado para mascarar o servilismo e vassalagem dos acólitos da TPA ao MPLA.
Para a UNITA, à medida que avançava a campanha para as eleições gerais de 23 de Agosto de 2017 a TPA estava a converter-se “numa autêntica máquina de propaganda político-partidária que utiliza o património público e os seus espaços privilegiados para publicitar a plataforma político-eleitoral do partido MPLA e do seu cabeça-de-lista”, João Lourenço.
Embora fosse verdade, não era novidade. Desde sempre a TPA desempenha este papel de criada para todos os serviços determinados por quem é o seu dono. Sempre ao serviço do MPLA, bajulou sem limites o seu patrono, José Eduardo dos Santos, tal como passou a bajular João Lourenço.
Por isso mesmo, disse o mandatário do Galo Negro, a UNITA ia “prescindir da cobertura da TPA nas restantes acções de campanha”. “Convidamos a TPA a não estar presente”, sintetizou Estêvão José Pedro Katchiungo.
Folha 8 com Lusa